internacional@pstu.org.br |
Declaração da Liga Internacional dos Trabalhadores sobre a revolução no Egito que derrubou o ditador Hosni Mubarak
LIT-QI |
• A gloriosa revolução egípcia deu um exemplo histórico a todos os povos do mundo e um novo e decisivo passo na expansão da revolução árabe. Hosni Mubarak, o ditador odiado e o mais importante agente do imperialismo e de Israel na região foi obrigado a sair pela ação determinada das massas durante 18 dias consecutivos. A derrubada desse ditador é, por isso, um enorme triunfo das massas egípcias e árabes.
Comemoração nas ruas do Cairo após a queda de Mubarak
A revolução colocou o regime contra a parede
O centro desse gigantesco processo esteve na Praça Tahrir (ou Libertação) no centro da capital, Cairo, que se converteu no centro dos protestos que percorreram todo o país. Milhões de egípcios exigiram “Fora Mubarak” e o regime. A ocupação da praça se tornou a expressão do poder do povo mobilizado, por oposição a um regime e suas instituições que deixaram de conseguir governar. O governo mandava acabar com a ocupação da praça e ninguém obedecia; decretou toque de recolher, mas as massas não lhe davam ouvidos. O processo galvanizou o país inteiro, e pudemos ver as massivas manifestações nas grandes cidades como Alexandria, Suez, Port Said e se estendendo a todos os cantos do país.
Com o país paralisado, o governo orquestrou uma tentativa contra-revolucionária de ataque violento contra os manifestantes, com o objetivo de derrotá-los e esvaziar a Praça Tahrir. Apesar da passividade do Exército e da covardia de um ataque de bandos armados contra manifestantes desarmados, os ocupantes da Praça Tahrir não se deixaram intimidar e expulsaram corajosamente os bandos do regime, compostas por policiais e mercenários.
Ao mesmo tempo em que perpetrava este ataque contra o movimento revolucionário, o governo chamou ao diálogo as forças de oposição toleradas e com a participação dos seguidores de El Baradei e da Irmandade Muçulmana. Apesar de estas forças não terem chegado a acordo com o regime, a sua participação significou de fato a legitimação de uma tentativa de transição negociada. Como resultado foram apenas anunciadas "reformas constitucionais" até as eleições de setembro e promessas de "concessões" vazias. As massas não acreditaram nessas manobras e continuaram exigindo a imediata saída de Mubarak, mantendo a ocupação da Praça no Cairo e principais cidades do país.
Já nos últimos dias, a classe operária e os trabalhadores começaram a intervir de forma decisiva com sua arma mais poderosa: a greve. Expressão disso foi a entrada em cena dos trabalhadores do Canal de Suez, dos trabalhadores da saúde e do transporte no Cairo, bem como dos trabalhadores das telecomunicações. Até mesmo os trabalhadores de órgãos de imprensa como Al Ahram resolveram parar contra o regime. Esta onda de greves que juntava reivindicações por melhores condições de vida com a exigência de saída de Mubarak foi paralisando a economia egípcia de forma cada vez mais comprometedora para os interesses da burguesia nacional e internacional. Os trabalhadores iam demonstrando assim que, enquanto Mubarak estivesse no poder, iriam até o limite para conseguir o que queriam.
Frente a tudo isto, o Exército foi incapaz de reprimir diretamente as mobilizações e se manteve assistindo as marchas massivas e a ocupação da Praça. O contato constante dos soldados e baixa oficialidade com os manifestantes aprofundaram os elementos de crise no Exército, o que foi tornando cada vez mais perigosa uma possível ordem da cúpula de repressão em massa, que poderia ter como resultado imediato a divisão do Exército frente à força revolucionaria do povo egípcio.
Ativista egípcio carrega bandeira manchada de sangue
Mubarak é obrigado a renunciar
Frente à insustentável manutenção de Mubarak, o imperialismo começou a procurar articular uma "transição segura", que garantisse um "governo leal", cuja tarefa fosse "estabilizar" o país, mantendo as instituições centrais do regime, com algumas concessões democráticas. O imperialismo apostou na cúpula do Exército para levar a cabo essa tarefa, tendo em conta a sua ligação orgânica ao imperialismo, a sua importância como pilar fundamental do regime e força repressiva, e também pelo certo prestígio que ainda mantinha entre as massas.
Após vários anúncios que apontavam no sentido da renúncia na noite de 10 de fevereiro, Mubarak fraudou a expectativa da nação com um discurso que, em que em vez de anunciar seu retiro, anunciava a sua manutenção no poder com a transmissão de alguns poderes para Suleiman.
A reação furiosa da população na Praça Tahrir no Cairo e em todo o país apontava a uma radicalização dos protestos que se esperavam ainda maiores para o dia 11. Na mesma noite, os manifestantes cercaram espaços centrais como o palácio presidencial e estação estatal de TV, que estavam protegidos pelo Exército. Esta situação se foi tornando cada vez mais alarmante, particularmente para a cúpula das Forças Armadas, pois colocava a possibilidade real de enfrentamentos dos manifestantes com os organismos de segurança. Tendo em conta os importantes elementos de crise no Exército, não havia qualquer garantia que uma tentativa de tomada destes edifícios pela população pudesse ser freada pelos soldados.
Com a ampliação massiva dos protestos e a perda definitiva do controle por parte do regime, Suleiman foi obrigado a vir à televisão para anunciar telegraficamente a renúncia de Mubarak e a entrega da condução do país ao Comando Central do Exercito. A saída de Mubarak foi uma conquista enorme, imposta pelas mobilizações das massas e por isso sentida com enorme alegria e emoção.
O centro do acordo é a estabilização burguesa através do Exército
Compartilhamos a enorme e justa alegria que perpassa as massas egípcias e de todo o mundo por haver se livrado de um ditador assassino e corrupto. Mas queremos fazer um alerta: o Comando do Exército egípcio que assumiu o poder, aparecendo como uma suposta mudança frente à liderança de Mubarak, sempre foi a espinha dorsal da ditadura egípcia.
Na verdade, o alto comando do Exército é proprietário de várias empresas em diferentes setores da economia (controlando cerca de 30 a 40% da economia do país), tendo-se enriquecido à sombra da ditadura, à custa da fome e miséria do povo.
Além disso, o Exercito é o pilar central do regime de Mubarak e cumpre um papel fundamental como aliado estratégico dos EUA e Israel na região, que se expressa diretamente na ajuda militar de cerca de 2 bilhões de dólares anuais dos EUA a esta instituição.
Pôde se ver esse papel das Forças Armadas quando deram cobertura às hordas pró-Mubarak, ao permitir que entrassem na praça para espancar manifestantes nos dias 2 e 3 de Fevereiro. Com a crise provocada pelo curso da revolução, a cúpula militar tenta agora assumir diretamente o processo, livrando-se da figura incômoda de Mubarak para manter seus privilégios e nenhuma mudança significativa no país. A maior expressão disso é a indicação de Mohamed Hussein Tantawi, Ministro da Defesa dos últimos 20 anos de Mubarak, para encabeçar o novo governo até as próximas eleições.
A política que o imperialismo em conjunto com o Exército quer impor àqueles que se mobilizaram durante 18 dias para tirar Mubarak e acabar com a ditadura é a aceitação uma abertura democrática controlada, em que os principais pilares do regime repressivo se mantêm, e que se garante o cumprimento dos acordos políticos, econômicos e militares com o imperialismo e particularmente com Israel.
Nesse processo de abertura controlada, os setores da oposição burguesa preparam-se para cumprir um papel fundamental. Nesse sentido, o setor encabeçado por El Baradei e a Irmandade Muçulmana já deram declarações favoráveis para compor com os militares um governo de unidade nacional que permita uma transição negociada até as próximas eleições e aceitam que se mantenham os acordos com o imperialismo e Israel.
Manifestante sobe em tanque de guerra durante protesto
Só a mobilização independente das massas pode levar adiante a revolução egípcia!
A grande vitória alcançada pela revolução egípcia com a derrubada de Mubarak é apenas o começo e não o fim da luta contra opressão do povo daquele país.
O imperialismo e a burguesia egípcia estão tentando impedir que o povo alcance uma vitória maior do que aquela que já conseguiu, evitando que a ruptura com o anterior regime se estenda. A maior expressão disso é que a proposta de novo governo é encabeçado por um homem estreitamente ligado a Mubarak e de plena confiança do imperialismo americano. A cúpula do exército, comprometida em todos esses anos de ditadura, não vai querer que se punam os crimes, que se julguem e prendam os repressores e torturadores, nem que se firam os interesses econômicos dos grupos que floresceram à sombra de Mubarak. Não vai querer a liberdade para que se possam denunciar os crimes da ditadura nem para que os trabalhadores tenham liberdade sindical e direito de greve que ameaçariam os lucros fabulosos desses grupos aos que a eles são vinculados. Um governo integrado pelos homens de Mubarak é um obstáculo à revolução!
A ditadura matou e torturou milhares de opositores. Durante os 18 dias de mobilizações, 300 mortos caíram para derrubar Mubarak. Para romper de vez com a era Mubarak é preciso, por isso, dissolver os aparatos repressivos que mantiveram pelo terror 30 anos de ditadura e punir os responsáveis pelas prisões, torturas e mortes daqueles que lutaram pelos seus direitos. Pela dissolução de todos os aparelhos repressivos! Punição a todos os responsáveis pelas torturas e mortes.
É necessário também continuar a mobilização para garantir imediatamente a libertação de todos os presos políticos e totais liberdades de associação sindical, de organização partidária e imprensa.
Sabemos que há uma divisão de classe nas fileiras do Exército. A confraternização e a incapacidade dos soldados e oficialidade média para reprimir as mobilizações são expressão disso. É necessário que os soldados e a oficialidade média tenham as mais amplas liberdades democráticas para se organizarem de forma independente das suas cúpulas, e se juntar às reivindicações e anseios da classe trabalhadora egípcias que não são os do imperialismo nem os dos generais de Mubarak.
Pela dissolução imediata do Parlamento fraudulento! Para acabar com o regime de Mubarak, não basta fazer reformas parciais na Constituição, como estão propondo o novo governo e a oposição burguesa! Pela convocatória de uma Assembleia Constituinte soberana com plenos poderes, sem ninguém que tenha sido parte dos organismos do regime de Mubak! Assembleia constituinte para romper os acordos com o imperialismo, para expropriar os bens de Mubarak e do conjunto do antigo regime, e construir um Egito socialista ao serviço dos trabalhadores e do povo!
A opressão do povo egípcio não se resume à ditadura e está ancorada na exploração e desemprego que condenam à fome e à miséria a maioria da população. A revolução não coloca em causa somente o atual regime, mas afeta diretamente o imperialismo dominante, sendo objetivamente uma revolução operária e socialista.
Para uma ruptura de fundo com o antigo regime é, por isso, fundamental romper os pactos militares e políticos com o imperialismo e Israel. Fora o imperialismo do Egito! Pela imediata e plena abertura da fronteira com a Faixa de Gaza!
Por um aumento imediato e geral dos salários que corresponda ao custo da cesta básica! Por um plano econômico de emergência e a redução imediata da jornada de trabalho sem redução de salário de forma a garantir trabalho para todos! Pela expropriação das grandes empresas nacionais e multinacionais e do sistema financeiro!
A única forma de garantir os anseios da juventude é a continuidade da revolução
A condição indispensável para cumprir os anseios das massas de construir um novo Egito, é que as mobilizações independentes continuem. Foram as mobilizações das massas e não o Exército que derrubaram Mubarak. Chamamos por isso as massas egípcias a não depositarem o destino da sua revolução nas mãos do Exército e a confiarem nas suas próprias forças.
A juventude, que cumpriu um papel extraordinário na vanguarda dessa mobilização e mostrou um heroísmo ao permanecer na praça todos esses dias apesar da repressão, deve continuar organizada e exigir as conquistas! A classe trabalhadora, além de estar no centro do combate contra Mubarak, já mostrou que pode parar o país.
A partir da vitória dos que ocuparam e mantiveram a Praça Tahir, está colocada a necessidade de continuar e impulsionar a mobilização e organização independente dos trabalhadores e jovens, de chamar um encontro urgente dos trabalhadores e do povo que discuta um programa o serviço das massas, oposto ao da cúpula militar e ao da oposição burguesa, e tome o poder em suas mãos para levá-lo a cabo.
É preciso desenvolver a revolução árabe!
Depois da Tunísia, a revolução árabe teve um grande triunfo com a derrubada de Mubarak. Vamos estendê-la a toda a região! Pela derrubada das demais ditaduras e monarquias reacionárias do mundo árabe e do Oriente Médio!
Mubarak foi um esteio da ordem imposta pelo imperialismo na região, cujo centro é o Estado de Israel. A revolução árabe não será triunfante enquanto o Povo Palestino estiver sob o tacão de Israel. Todo apoio ao Povo Palestino! Pela destruição do Estado de Israel!
Esse processo revolucionário tem também como desafio enfrentar os regimes ditatoriais teocráticos, como o Irã, que reprimiu durante as mobilizações contra a fraude ano retrasado e que mantém a exploração do seu povo, apesar do choque eventuais com o imperialismo.
A revolução árabe coloca na ordem do dia recuperar a unidade da nação árabe na perspectiva de construir uma grande Federação das Repúblicas Socialistas Árabes!
São Paulo, 11 de Fevereiro de 2011
Nenhum comentário:
Postar um comentário