Quase 1 milhão de brasileiros voltaram à miséria em 2013, segundo boletim divulgado nesta quinta-feira (16) pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada). Segundo os números --que levam em conta os dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE--, o percentual de famílias em pobreza extrema saltou de 3,63% em 2012 para 4,03% em 2013. Para o Ipea, a recessão e o ajuste fiscal são ameaças às políticas sociais do governo.
Levando em conta que em 2013 a população brasileira era de 201 milhões de pessoas, segundo o IBGE, o número de pessoas em pobreza extrema passou de 7,2 milhões, em 2012, para 8,1 milhões, no ano seguinte. Foi a primeira alta desde 2005, quando o percentual de pessoas na miséria, entre um ano e outro, caiu de 7,58% para 7,02%.
Para o Ipea, o percentual –apesar de pequeno do ponto de vista estatístico-- não deve ser desprezado. "Na discussão em torno da leitura dos resultados desta pesquisa, alguns analistas argumentaram que a variação da taxa da pobreza extrema foi muito pequena, não sendo, portanto, estatisticamente relevante. Variações de magnitudes similares nos anos anteriores foram comemoradas como avanços na redução da miséria", avalia.
Motivos da alta
No boletim, o Ipea citou que a ausência de correção monetária dos benefícios do programa Bolsa Família entre 2011 e 2014 foi o principal motivo para o aumento da miséria. "O último reajuste dos benefícios ocorreu em abril de 2011. A inflação acumulada entre o último reajuste e o atual é de 20,43%, portanto bem superior ao reajuste concedido", cita.
Em maio de 2014, o governo anunciou um reajuste do benefício básico do Bolsa Família em 10%, passando de R$ 70 para R$ 77 mensais. O aumento, porém, focou nas pessoas em condição de pobreza extrema, não elevando o valor de quem ganha mais.
"Percebe-se, então, que o programa concentrou seus esforços nos mais miseráveis nos últimos anos, em consonância com o Plano Brasil sem Miséria, e tal escolha traz consequências para sua afirmação como benefício do sistema de garantia de renda. Para as demais famílias pobres, as transferências perderam poder de compra frente ao aumento do custo de vida", explica.
Além disso, para explicar a alta, o Ipea afirma que as linhas de acesso (que definem a renda mínima para considerar pobreza extrema) não eram revisadas desde julho de 2009. "Nesse período, a renda média cresceu e a inflação acumulou 32,27%. Da mesma forma, também pelo efeito inflacionário, o impacto da transferência nas condições de vida das famílias beneficiadas diminui ao longo do tempo", diz.
Para efeito de cálculo, entre 2009 e 2014, o governo considerou famílias com renda per capita média abaixo de R$ 70 como em pobreza extrema.
Política social em risco
Em sua análise, o boletim do Ipea ainda traça um cenário pouco otimista quando se refere à manutenção das conquistas sociais. "As expectativas para o comportamento futuro da extrema pobreza são preocupantes, considerando o cenário de ajuste fiscal e as previsões negativas para o desempenho da economia e do mercado de trabalho", assegura.
O instituto ainda vê ameaça da crise econômica ao projeto social. O risco vem com as medidas adotadas pelo governo federal neste ano. "Não se pode garantir que a condução da agenda da pobreza não representa risco futuro à institucionalidade atual das políticas sociais, especialmente no contexto de ajuste fiscal e reformas no acesso a direitos sociais que marcam o início do segundo governo Dilma", aponta.
No último dia 7, a Folha revelou que o ex-diretor do Ipea Herton Araújo contou à Justiça Eleitoral que foi impedido de divulgar, durante a campanha de 2014, dados da Pnad que mostravam aumento da extrema pobreza no Brasil. O Ipea é vinculado à SAE (Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência).
O depoimento foi tomado em 27 de maio e faz parte de uma ação movida no final do ano passado pelo PSDB contra Dilma Rousseff e Michel Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A ação pede a cassação da chapa encabeçada pela petista por abuso de poder econômico e político.
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