A Lei Complementar 135/2010 (Lei Ficha Limpa) é uma grande conquista popular, apoiada em um milhão e setecentas mil assinaturas de eleitores, mostrando que o exercício da cidadania é possível e que o povo deve ser ouvido por seus representantes.
Esta lei aumentou o prazo de inelegibilidade, mas seu maior mérito é o de sepultar a discussão acerca do princípio da presunção de inocência, cuja aplicação no âmbito eleitoral era ampliada, conferindo-se-lhe efeito não existente na área criminal.
Ela veio confirmar que o princípio da presunção de inocência não possui valor absoluto – nenhum possui -, daí ser preciso conjugá-lo com os demais para que um direito não seja preterido por outro de igual valor.
Ainda que o povo seja o titular do poder e o processo eleitoral aparente ser democrático, essa verdade não se confirma inteiramente na política brasileira, visto que a maioria da população é pobre e vota atendendo aos interesses e sob a influência dominante dos poderosos, o que corresponde a uma autêntica oligarquia. Esta é a nossa realidade, daí ser errado pensar que “somente ao povo cabe rejeitar nas urnas os candidatos inidôneos” e não à lei impor restrições. Ora, o laissez faire, laissez passer foi ineficaz na área econômica, como aplicá-lo na área política? A intervenção estatal sempre se impõe, justificada como forma de garantir uma liberdade ética.
Permitir que criminosos possam governar e legislar para uma coletividade é romper com os valores mais elevados desse grupo. Disso resulta a transposição da criminalidade como “poder invisível” para a esfera do “poder visível”, trazendo o estado paralelo à superfície de forma legalizada.
Espera-se, com a nova lei, que a punição dos corruptos impedindo seu acesso ou permanência nos cargos políticos faça desse país um lugar melhor. É preciso dizer não à banalização do princípio da inocência, não tolerando sua utilização como escudo de impunidade que penaliza a sociedade e apequena a Constituição, transformando-a na Constituição de Lassalle (mera folha de papel).
Nilce Cunha Rodrigues - Procuradora Regional Eleitoral Auxiliar
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