28 abril 2006

Política externa e desenvolvimento

Depois da independência, e durante a primeira metade do século XIX, o Brasil e os demais países latino-americanos não dispunham de Estados e economias nacionais efetivos, nem constituíam um sistema político e econômico regional. Por isso, com facilidade, foram colocados numa posição periférica, dentro da geopolítica mundial, e foram transformados imediatamente – com o total apoio das elites locais – no primeiro laboratório de experimentação dos famosos “Tratados Desiguais” ou de “livre-comércio”, que depois atuaram como chave de entrada e expansão do império britânico, na África e na Ásia. No Brasil, mesmo depois da proclamação da República, e pelo menos até a crise de 1930, o Estado seguiu sendo fraco e tendo baixa capacidade de incorporação e mobilização política nacional, sem ter nenhum tipo de pretensão expansiva. E apesar do início da industrialização e das primeiras filiais internacionais,o pólo dinâmico da economia da “velha república” seguiu sendo “primário-exportador”. Essa inserção econômica permitiu ao Brasil crescer a taxas médias razoáveis, até a crise de 30, graças à complementaridade de sua economia interna com os mercados europeus e com o capital financeiro inglês. Além disto, ao contrário de outras economias semelhantes, a economia exportadora brasileira ajudou a criar um mercado interno de alimentos e de mão-de-obra migrante, e uma extensa rede de transportes e comercialização, sobretudo no caso do complexo cafeeiro. Entre a crise econômica mundial de 1930 e o início da II Guerra Mundial, o Brasil reagiu ao “estrangulamento econômico” externo provocado pelas guerras e pela crise internacional, implementando políticas públicas que fortaleceram o estado central e a sua economia nacional. Mas, no caso da política externa, sua autonomia durou pouco, e em 1938, o Brasil já havia se alinhado ao lado da nova liderança mundial norte-americana. Depois da II Guerra Mundial, o Brasil não teve posição relevante na geopolítica da Guerra Fria, mas foi colocado na condição de principal sócio econômico dos Estados Unidos, dentro da sua periferia sul-americana. Não houve Plano Marshall para a América Latina, nem o Brasil teve acesso privilegiado aos mercados norte-americanos, como no caso dos “desenvolvimentos a convite” europeus e asiáticos. Mesmo assim, o Brasil se transformou numa experiência original de desenvolvimento acelerado e industrialização pesada, depois de 1955, sob a liderança dos investimentos estatais e do capital privado estrangeiro, proveniente de quase todos os países do núcleo central do sistema capitalista. Neste período, entretanto, apesar do seu alinhamento incondicional, ao lado dos Estados Unidos , na Guerra Fria, o Brasil começou a exercitar uma política externa mais autônoma, combativa e global, ao lado de suas políticas econômicas desenvolvimentistas. Como no caso da iniciativa da Operação Pan-americana, em 1958, e da Operação Brasil-Ásia, nos anos 1959-60, durante o governo de Juscelino Kubitschek, que também se aproximou da Europa e da África Negra, enquanto rompia relações com o FMI. Esta nova posição internacional do governo brasileiro avançou no início da década de 60, com a “política externa independente” do governo Jânio Quadros, que incentivou a aproximação do Brasil com América Latina, Ásia e África, e também com o mundo socialista e o Movimento dos Países Não-Alinhados. Além disto, o Brasil teve uma participação ativa nos processos de criação da ALALC, da UNCTAD e do Grupo dos 77, na ONU. Esta mesma política externa foi retomada com alguns traços ainda mais agressivos e autonomistas, a partir do governo militar do Gal. Ernesto Geisel, na segunda metade dos anos 70, a despeito do seu alinhamento incondicional, ao lado dos EUA, na sua luta anticomunista. E foi mantida pelo primeiro governo democrático de José Sarney, apesar da prolongada crise da “dívida externa” vivida pelo país durante toda a década de 80.No início dos anos 90, a vitória americana na Guerra Fria, junto com a utopia da globalização e uma grande onda de liquidez internacional criaram as bases materiais e ideológicas da nova virada do desenvolvimento e da política externa brasileiros. Em particular, entre 1994 e 2002, quando o governo Fernando H. Cardoso apostou numa associação íntima com os Estados Unidos - e em particular com Bill Clinton - enquanto o seu governo desmontava o estado desenvolvimentista e promovia a volta do Brasil ao modelo livre-cambista do século XIX. Mas, depois de 2003, durante o governo Luiz Inácio da Silva, a política externa brasileira mudou de rumo, retomou o caminho da integração e do fortalecimento político e econômico da América do Sul, e da intensificação dos laços políticos, comerciais e tecnológicos com a África e a Ásia, procurando globalizar as questões internas do “hemisfério ocidental”.Nesta nova direção, contudo, o mais importante vem sendo a posição de destaque e de sustentação que o Brasil acabou ocupando – neste período – no debate cada vez mais intenso e generalizado que está se travando em toda a América do Sul, sobre uma nova posição internacional do continente, e em particular, sobre a redefinição da hegemonia hemisférica dos Estados Unidos. Neste momento, não há como não ver: este é o grande tema e o grande conflito que opõem entre si, de norte ao sul, as lideranças populares e políticas, as elites econômicas e os intelectuais sul-americanos.Nesta luta, em particular no Brasil, existem hoje duas forças ou atores que atuam decisivamente a favor de uma opção liberal e subalterna: i) uma intelectualidade – em geral de classe média – que se deslumbra ao chegar perto do poder político ou financeiro internacional e se transforma em defensora e porta-voz de uma espécie de “cosmopolitismo de cócoras”, ii) e uma elite econômica, cujo “descompromisso nacional” é legitimado por esta mesma intelectualidade, e que nunca precisou lutar ao lado do seu próprio povo – como na Europa, na Ásia e também nos Estados Unidos – para assegurar a acumulação da sua riqueza, e garantir a sua própria segurança, conseguindo ou preferindo refugiar-se nos circuitos financeiros internacionais, e submeter-se à tutela estrangeira da potência dominante.

17 abril 2006

Massacre de Eldorado dos Carajás: 10 anos de impunidade

O massacre de Eldorado dos Carajás, que vitimou fatalmente 19 sem-terra e deixou mais de 60 feridos após uma ação violenta da Polícia Militar para desbloquear a rodovia PA-150, completa dez anos sem que nenhum dos culpados esteja preso. A rodovia estava ocupada por uma marcha do MST que se dirigia à Marabá para exigir a desapropriação da fazenda Macaxeira, área improdutiva que hoje abriga o assentamento 17 de Abril.
Dos 144 militares indiciados, os dois únicos condenados - o coronel Mário Collares Pantoja, condenado a 228 anos, e o major José Maria Pereira de Oliveira, condenado a 154 anos de prisão – foram postos em liberdade por decisão do Superior Tribunal Federal (STF) no final de 2005, depois de pouco menos de um ano de reclusão. Ambos estão aguardando em liberdade o resultado do recurso especial apresentado ao Superior Tribunal da Justiça e do recurso extraordinário apresentado ao STF. Os responsáveis políticos pelo massacre, o governador Almir Gabriel e o secretário de Segurança Pública, Paulo Sette Câmara, não foram indiciados.
Mesmo tendo sido assentados posteriormente na área pleiteada, grande parte dos cerca de 70 sem-terra que foram vítimas da PM no dia 17 de abril de 1996 ainda sofre com graves problemas de saúde. Muitos continuam com balas alojadas no corpo, vários não conseguem trabalhar em função das mutilações, e, segundo os trabalhadores rurais e os advogados do MST, o Estado não tem prestado o atendimento médico acordado legalmente com o movimento.
Para relembrar o massacre, desde 1º de abril o MST organizou no local, a “Curva do S” na PA-150, um acampamento com cerca de 2 mil jovens de vários Estados que, além de atividades culturais e de formação, estão promovendo manifestações diárias contra a impunidade.
Nesta segunda-feira (17), o MST e várias organizações de direitos humanos promoveram na Curva do S um ato ecumênico pela manhã (parte do calendário da Igreja desde o massacre). Pela tarde, lideranças do MST, como o coordenador nacional João Pedro Stédile, Dom Thomas Balduino, conselheiro da CPT, e o advogado da entidade no Pará, Frei Henri (que está ameaçado de morte), além do ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, entre outros, participam de uma coletiva de imprensa.
Às 17 horas, horário do massacre em 2006, haverá um grande ato com o bloqueio da PA-150. Neste mesmo horário, em outros 23 Estados, também ocorrerão manifestações. Entre as atividades relacionadas à data, de acordo com o MST, em Santa Catarina ocorrerá uma marcha para Florianópolis, de 17 a 20 de abril; na Bahia, a marcha saiu de Feira de Santana para chegar em Salvador nesta segunda; no Mato Grosso do Sul, acontece uma vigília em frente ao Fórum de Campo Grande; Goiás terá quatro marchas para a capital, Goiânia, que saem dia 17 e chegam dia 1º de maio, dia do Trabalho, quando acontecerá um ato massivo em conjunto com os movimentos urbanos; no Rio Grande do Sul, acontecerão debates da Universidade Federal, uma exposição de fotos de Sebastião Salgado e uma vigília em frente ao Tribunal da Justiça.
Em São Paulo, onde também começa o encontro estadual do MST, o ato nesta segunda acontece na Praça da Sé. Em Brasília, as atividades começaram pela manhã com uma sessão solene no Plenário Ulysses Guimarães da Câmara dos Deputados. À tarde, outra sessão solene, marcada para as 16 horas, acontece na Câmara Distrital. Ao final das atividades, os integrantes do MST plantarão 19 árvores frutíferas na área externa da Câmara, em memória aos trabalhadores mortos.

TENSÃO NO PARÁ
A situação dos conflitos agrários no Pará, Estado campeão de mortes de lideranças agricultoras, vem se acirrando nos últimos meses. Em função do mês de Luta do MST, os movimentos (também a Fetagri, ligada à CUT) realizaram várias ocupações, que levaram à prisão de seis trabalhadores rurais e uma morte, segundo denúncias.
No mês de março, a Polícia Militar retomou uma onda de despejos, iniciada no ano passado por decisão da Justiça. Segundo a assessoria do MST, “um efetivo de 280 PMs cumpre a operação de reintegração de posse de áreas ocupadas”. “O Estado declarou que vai manter a operação, custe o que custar. O discurso do Estado tem sido empurrar a responsabilidade para o governo federal”, diz uma nota do movimento, emitida no final de março.
No início de abril, o MST declarou, em nova nota, que “as ações realizadas pelos trabalhadores/as do sul e sudeste do Pará são o resultado da ação isolada do governo do Estado e do Poder Judiciário, que descumpriram todos os acordos estabelecidos em audiências anteriores, como a que estabeleceu que qualquer ação que envolva áreas de interesse de reforma agrária passaria por uma discussão ampla na perspectiva de estabelecer um acordo que beneficiasse a segurança e o bem estar dos trabalhadores e trabalhadoras”.
Segundo o MST, no Sul do Pará a situação é a mais crítica. “Há sete anos, famílias acampadas no Acampamento 26 de março aguardam do STF o decreto de desapropriação da Fazenda Cabaceiras, que consta na lista da prática de trabalho escravo, crimes ambientais e grilagem de terras da União. Temos o caso das famílias do Acampamento Lourival Santana que há dois anos estão em parte da Fazenda Peruano, terra esta comprovadamente grilada. A impunidade reinante nos casos de assassinatos de trabalhadores/as, lideranças, religiosos/as e advogados”.
E conclui: “entendemos que ameaças, prisões não irão resolver o problema agrário brasileiro. Portanto, as famílias da região Sul e Sudeste do Estado reivindicam a suspensão imediata de todos os mandatos de despejo expedidos pela Vara Agrária para esta região, a retirada imediata da Tropa de Choque da Polícia Militar da região e a desapropriação e o assentamento de todas as famílias que se encontram acampadas”.

12 abril 2006

Sindicato faz protesto contra a paralisia da mesa permanente

Conforme deliberação do COE BASA aí vai a proposta de nota chamando a manifestação.



Nesta quarta-feira, às 07:30 horas, na porta da Matriz do Banco da Amazônia, ocorreu um protesto organizado pelo Sindicato dos Bancários contra a paralisia da mesa permanente que não tem promovido avanços das pautas apresentadas pelos trabalhadores.

PLR
Apesar dos esforços dos representantes dos trabalhadores reivindicarem o pagamento da PLR similar ao negociado entre CNB e FENABAN (80% do salário bruto + R$-800,00) o Banco insiste em pagar uma PLR de 1 salário bruto que estará premiando o alto escalão da instituição em detrimento de uma grande massa de trabalhadores.

OPERADORES DE REDE
A falta de uma solução para a situação dos 76 operadores de rede descomissionados em 31 de dezembro do ano passado.

ISENÇÃO DE TARIFAS BANCÁRIAS
Apesar da entrega do documento comprovando que outras instituições como o Banco do Brasil realizam isenção total das tarifas bancárias o Banco da Amazônia insiste no silêncio quanto a questão.
Um abraço
Marlon George
Diretor SEEB-PA

05 abril 2006

A Arena ressuscitou com o PSDB!

O PSDB conseguiu um tento em São Paulo, estado e município: patrocinou a volta da Arena – o partido de apoio à ditadura militar – à prefeitura e ao governo. Deste último, ela havia sido escorraçada em 1982, e nunca mais voltara. Agora, Geraldo Alckmin e José Serra desincompatibilizaram-se de seus cargos e deixaram as respectivas cadeiras sob responsabilidade de seus vices, Claudio Lembo – ex-secretário do prefeito biônico de São Paulo, o banqueiro Olavo Setubal (1975-1979) – e Gilberto Kassab, direitista de nova cepa. Ambos são dirigentes do PFL, herdeiro da velha legenda.É um feito impressionante, celebrado em 31 de março, justamente o dia em que se comemoravam os 42 anos do golpe de 1964. Viúvas do regime que desgraçou o país por 20 anos, saudosistas dos tempos da censura, prisões arbitrárias, torturas e assassinatos devem estar radiantes. O PFL (Partido da Frente Liberal) surgiu em fins de 1984, como um dos rachas do PDS (Partido Democrático Social), criado em 1979. Eleitoralmente sempre teve um desempenho desastroso em São Paulo. Voltemos a fita, para que tudo não acabe em sopa de letrinhas.Uma derrota difícil de engolirEm outubro de 1965, pouco mais de um ano após o golpe, são realizadas eleições para governadores em 11 estados. O regime é derrotado em cinco deles, entre os quais Minas Gerais e Rio de Janeiro. Os setores mais duros pressionam o presidente Castello Branco a acabar com a festa. O Ato Institucional nº. 2 extingüe os partidos políticos. No início do ano seguinte, o AI-3 acaba com as eleições diretas para presidente, governadores e prefeitos das capitais. Nos meses seguintes são criados dois partidos, a Arena, governista, e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), oposicionista, para dar uma fachada arejada à vida nos tempos de exceção. A Arena cumpriu seu roteiro, mas o MDB, por força de várias pressões, fugiu do script e começou a acolher os descontentes com a situação.Herdeira do fisiologismo e do reacionarismo que sempre marcaram a vida nacional, a Arena nunca teve um bom desempenho nos grandes centros urbanos, mesmo nos períodos mais duros. Em 1974, a agremiação sofreu vexatória tunda em 16 estados, nas eleições para o Senado, a Câmara dos Deputados e as Assembléias Legislativas. O MDB, de Ulysses Guimarães, emerge como o grande vencedor e espinha dorsal da frente de oposições que acaba por derrotar a ditadura na década seguinte.Panteão de reaçasIntegraram a Arena, entre outros luminares da direita nacional, Plínio Salgado, líder integralista, Filinto Müller, temido chefe de polícia do Estado Novo (1937-1945) e responsável pelo envio de Olga Benário para a morte num campo de concentração nazista, Roberto Campos, economista modelo de gente como Pedro Malan e Antonio Palocci (e de tão entreguista era apelidado de Bob Fields), Paulo Maluf, Jorge Bornhausen, Antonio Carlos Magalhães e Delfim Netto.Desacreditado, o regime resolve, em 1979, dar uma rasteira nas regras do jogo que seus ideólogos haviam estabelecido. Para dividir o MDB, incentiva a criação de vários partidos, enquanto tenta uma operação plástica em sua legenda. A Arena ressurge com o nome de Partido Democrático Social e as eleições municipais de 1980 são canceladas, como parte da manobra.Inútil. Em 1982, as primeiras eleições para governador desde 1965, transformam-se em um claro plebiscito sobre a ditadura. Nova surra na Arena, que vê a oposição eleger dez mandatários em 22 estados. Detalhe: entre essa dezena estavam São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais,Paraná e Rio Grande do Sul, os mais importantes.No estado de São Paulo, Franco Montoro, do PMDB, tem 5,2 milhões de votos e derrota Reynaldo de Barros, do PDS, com 2,7 milhões. Como não havia eleições diretas nas capitais, Montoro indica como prefeito Mario Covas, antes de sua conversão neoliberal. Anos depois, a direita ganharia uma sobrevida na cidade de São Paulo, com a eleição de Janio Quadros (1985-1988). Mas aí, o candidato do PMDB não ajudava. Era ninguém menos do que Fernando Henrique Cardoso. A essa altura, após a campanha das Diretas-Já e com o fim da ditadura, o PDS divide-se em dois, para tentar salvar os cacos da representação política das várias nuances do reacionarismo pátrio. Uma de suas marcas-fantasia, o PPB (Partido do Povo Brasileiro) surpreende ao eleger Paulo Maluf (1992-1996) e Celso Pitta (1996-2000) prefeitos da capital. Mas no estado, os continuadores na Arena não tiveram mais vez.É certo que o governo Lula, ao evitar a todo custo mostrar a existência de interesses econômicos diversos na sociedade e ao perpetuar a orientação econômica de seus antecessores, dá sua mãozinha para a criação de um ambiente propício à volta da velha Arena. Mas o mérito maior vai para Geraldo Alckmin e José Serra. Nas tumbas onde se encontram, Castello Branco, Costa e Silva, Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Figueiredo e golpistas de ontem e de hoje têm uma dívida de gratidão para com o PSDB de São Paulo.